08/01/2014

A terra de Florbela



POBRE DE CRISTO


A. J. Emídio Amaro


Ó minha terra na planície rasa,
Branca de sol e cal e de luar,
Minha terra que nunca viu o mar,
Onde tenho o meu pão e a minha casa.

Minha terra de tardes sem uma asa,
Sem um bater de folha... a dormitar...
Meu anel de rubis a flamejar,
Minha terra mourisca a arder em brasa!

Minha terra onde meu irmão nasceu,
Aonde a mãe que eu tive e que morreu,
Foi moça e loira, amou e foi amada!

Truz... truz... truz... — Eu não tenho onde me acoite,
Sou um pobre de longe, é quase noite,
Terra, quero dormir, dá-me pousada!...

Florbela Espanca




Soneto inicialmente intitulado «Minha terra» e publicado no periódico D. Nuno, nº 125, 19.05.1929, Vila Viçosa, p. 2. - Integrado no volume Charneca em flor (1931).